sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

“Sou filha de Deus e não tenho medo de morrer”, disse cristã em prisão na Coreia do Norte

“Sou filha de Deus e não tenho medo de morrer”, disse cristã em prisão na Coreia do Norte

Os cristãos que vivem na Coreia do Norte, país que proíbe qualquer expressão do cristianismo, enfrentam riscos diariamente. Por causa disso, eles não podem compartilhar sua fé abertamente e escondem sua crença até mesmo dos familiares mais próximos.

Só um pequeno número de cristãos norte-coreanos conseguem alcançar novos convertidos. Este foi o caso de uma mulher entrevistada pela Associated Press, que viu a conversão de 10 parentes e vizinhos e realizou cultos secretos antes de desertar para a Coreia do Sul.

“Eu queria construir minha igreja e cantar o mais alto que pudesse”, disse a mulher, que agora é pastora em Seul, capital sul-coreana. Ela foi identificada com suas iniciais, HY, por questões de segurança.

A Unification Strategy Institution, uma entidade de pesquisa em Seul, ouviu testemunhos sobre repressões religiosas, semelhantes ao de HY, em entrevistas com mais de 1.000 desertores da Coreia do Norte nos últimos 20 anos.

A Coreia do Norte tem cinco igrejas sancionadas pelo governo em sua capital, Pyongyang, mas especialistas dizem que elas são falsas — destinadas a encobrir os abusos religiosos do país e ganhar ajuda externa. O país tinha uma população crescente de cristãos antes da Guerra da Coreia (1950-1953), mas passou a promover repressões contra a crença que o governo vê como uma ameaça ocidental liderada pelos Estados Unidos.

“De uma perspectiva externa, não há absolutamente nenhuma liberdade religiosa na Coreia do Norte”, disse Kim Yun Tae, presidente da Unification Strategy Institution, que não é religioso.

Testemunho nas prisões

A maioria dos cristãos remanescentes na Coreia do Norte aprenderam sobre a religião quando foram para a China, depois que uma fome devastadora matou centenas de milhares de pessoas em meados dos anos 90. Mais tarde, os convertidos foram capturados e enviados de volta para o Norte.

A maioria negou sua fé enquanto era interrogada, enquanto outros defenderam sua crença com ousadia. Outra desertora em Seul, Kwak Jeong-ae, 65, contou que uma colega na Coreia do Norte falou sobre sua fé aos guardas e insistiu em usar seu nome de batizado, em vez de seu nome coreano original, durante um interrogatório em 2004.


Desertor norte-coreano durante uma entrevista em Seul, Coreia do Sul. (Foto: AP Photo/Lee Jin-man)

“Ela insistiu em dizer: ‘Meu nome é Hyun Sarah. É o nome que Deus e minha igreja deram a mim’”, disse Kwak. “Ela disse [aos interrogadores]: ‘Sou uma filha de Deus e não tenho medo de morrer. Então, se você quiser me matar, vá em frente e me mate’”.

Kwak lembra que mais tarde viu Hyun, então com 23 anos, voltando do interrogatório com fortes hematomas na testa e sangrando pelo nariz. Dias depois, os guardas levaram Hyun embora para sempre.

Fé em segredo

Uma outra desertora, que manteve anonimato, contou que orava debaixo do cobertor ou no banheiro para não ser pega. Outro, que foi preso após ser repatriado da China, descreveu a oração silenciosa em sua cela depois que um detento compartilhou alguns preciosos grãos de milho.

“Nós nos comunicávamos escrevendo em nossas palmas [com nossos dedos]. Eu disse a ele que era cristão e perguntei se ele também era”, disse o homem, que pediu para ser identificado apenas como JM.

Jung Gwangil, um desertor norte-coreano que se tornou ativista, conta que viu um homem orando e cantando hinos quando foram presos juntos na cidade de Hoeryong, no norte do país, em outubro de 1999. O homem era espancado com frequência e um dia foi arrastado para fora.

“Ao sair, ele gritou para nós: ‘Deus vai te salvar’. Eu não tinha conhecido o cristianismo antes dessa época e achei que ele era maluco”, disse Jung. Ele não sabe o que aconteceu com o homem.

Depois que HY foi mandada de volta para a Coreia do Norte, ela começou um trabalho missionário com apoio financeiro que recebia de outros grupos cristãos. Ela tentou conquistar a confiança das pessoas emprestando dinheiro, distribuindo milho e ajudando em funerais antes de contar a elas cautelosamente sobre o cristianismo.

“Nós cantávamos hinos muito quietos, olhando os lábios um do outro. Eu acabava chorando com bastante frequência”, disse ela sobre seus convertidos.


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